Ela me dizia aflita que sua filha nascera com essa característica de personalidade, “preguiçosa”.
Mas como assim? Lhe perguntei.
- Ah! Não sei por que? Mas ela demora muito pra mamar... Fica horas pendurada em mim. Dorme, acorda o tempo todo, mas sempre querendo mais. Minha mãe já me avisou: se eu deixar...! Já viu!!!
Pensei cá com os meus botões, mal nasceu e já foi taxada de preguiçosa... Coitada!
Pior é que é muito comum. Inclusive já sair da Maternidade com esse carimbo na testa.
Vamos ao dicionário? “Pessoa preguiçosa; que tem excesso de preguiça; indolente ou malandro, vadio. Que não demonstra empenho na realização de qualquer coisa; que expressa falta de capricho.”
Pode parecer exagero da minha parte, eu sei, mas o poder das palavras é imensurável! Além disso, é claro, ocorre o mais comum e cruel equívoco: o bebê, nas primeiras semanas de vida, tem uma grande dificuldade para fazer a pega correta, por isso se cansa imensamente ao mamar, o que o força a parar de tempos em tempos para descansar, apesar de não ter saciado sua fome, ou seja, terminado a mamada. Dali a pouco pede para voltar ao seio. E o que sua mãe faz, influenciada pelas pessoas que estão à sua volta? O taxa de preguiçoso. Assim fazendo, não procura por ajuda profissional de qualidade para corrigir a pega e tornar aquela mamada mais eficiente e consequentemente mais curta. Em pouco tempo o cansaço e ansiedade fazem com que a dupla mãe/bebê desemboque no desmame precoce, com a oferta de leite adaptado.
Junto com os palpites preconceituosos em relação à personalidade do bebê vêm uma série de orientações estranhíssimas, especialmente quando vindas de profissionais da saúde. Elas vão de: cutuque o bebê enquanto mama, até tire toda a roupa dele para que sinta frio e não durma. Oi?!
Essa mãe que me procurou, de alguma forma e sem se dar conta, não aceitou de imediato o que as pessoas à sua volta falavam, e por isso lançou mão do seu computador para conversar com uma estranha ( euzinha ) que talvez lançasse um outro olhar para aquela situação. Assim eu o fiz. Propus para ela que visse sua bebê como um pequeno ser, que sem nem saber que existia, procurava aprender a se alimentar de uma forma natural, mas extremamente sofisticada, que é a amamentação. Disse-lhe que a bebê precisava de sua ajuda e que apesar dela, mãe, também ser uma marinheira de primeira viagem, estava muito mais em posição de fazê-las saírem daquele impasse, as tais das mamadas longas e ineficientes. Conversei muito também sobre a disponibilidade da mãe para com seu bebê recém nascido. Disponibilidade essa tão difícil atualmente de oferecermos aos nossos filhos sem enorme angústia e inquietação. Os bebês quando acabam de nascer precisam de nós de uma forma que nem dá para mensurar. São semanas e meses de nossas vidas que doamos para eles e que não tarda nos retornam em forma de vínculo e tranquilidade.
Que preguiçosa o que?! Ela é simplesmente um bebê aprendendo, no seu próprio tempo, a viver.
Fonte: Revista Crescer
Comments